O litoral norte paulista, conhecido por suas praias e pela diversidade ambiental, tem recebido cada vez mais atenção em estudos sobre os impactos das mudanças climáticas.
Pesquisadores alertam que transformações graduais, como a elevação do nível do mar e a erosão costeira, somadas ao aumento na frequência de chuvas intensas, já começam a alterar a dinâmica natural e urbana de municípios como São Sebastião, Ubatuba, Caraguatatuba e Ilhabela.
De acordo com estudo da Escola Politécnica da USP, dados de marégrafos entre 1944 e 2007 mostram que a maré baixa na região se elevou a uma taxa de 70 centímetros por século. A projeção é que o aumento chegue a 1 metro até 2100. Outro levantamento da mesma Instituição estima que as cotas de inundação costeira podem alcançar até 1,83 metro em 2050 e 2,11 metros em 2100. Hoje, mais da metade das praias da região (51,5%) já se encontram em situação de alto ou muito alto risco de erosão.
Os eventos extremos também se tornaram mais frequentes e intensos. Em fevereiro de 2023, em menos de 24 horas, choveu mais de 600 milímetros em São Sebastião e municípios vizinhos. A tragédia deixou 65 mortos, milhares de desabrigados e expôs a fragilidade das cidades diante de chuvas associadas a anomalias da temperatura do mar, que registrou elevação de até 3°C naquele período.
Vulnerabilidade urbana amplia riscos
Além das condições climáticas, a ocupação irregular agrava a situação. Levantamento acadêmico identificou que muitos domicílios estão localizados em áreas de declive e alto risco de deslizamento. O avanço da urbanização em direção a encostas e manguezais, especialmente entre 2000 e 2010, aumentou a exposição da população a desastres naturais.
Segundo dados do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), cerca de 4 mil moradias em São Sebastião estão localizadas em áreas suscetíveis a deslizamentos ou inundações. Em Caraguatatuba, estima-se que há 19 áreas de risco no município. O problema é agravado pela ausência de infraestrutura adequada de drenagem, coleta de resíduos e sistemas de contenção de encostas
Ações governamentais e planos municipais
Nos últimos anos, governos e instituições têm buscado alternativas para adaptação. Em 2025, o estado de São Paulo deu início ao Plano Estadual de Adaptação e Resiliência Climática (PEARC), com duração de três anos e ações voltadas à biodiversidade, zona costeira, segurança hídrica, segurança alimentar e saúde pública.
Além disso, o governo estadual, em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), anunciou investimentos em projetos de infraestrutura para contenção de encostas, modernização de sistemas de drenagem e reforço da defesa civil nos quatro municípios do litoral norte.
No âmbito local, planos municipais de redução de riscos têm buscado mapear áreas vulneráveis, realocar famílias e adotar estratégias de urbanização mais resilientes. Em São Sebastião, por exemplo, há iniciativas voltadas à recuperação de áreas degradadas e implantação de sistemas de alerta precoce para chuvas fortes.
Comércio local e turismo sustentável
No litoral norte, pousadas, restaurantes e comércios têm buscado alternativas que conciliam desenvolvimento econômico e preservação ambiental.
Para Rodrigo Alves, proprietário da Pousada Porto Mare, localizada em Maresias, turismo e preservação caminham lado a lado. “O litoral norte de São Paulo é uma região privilegiada por sua beleza natural, mas também sensível do ponto de vista ambiental”.
“Turismo e preservação não precisam andar em direções opostas; pelo contrário, quando bem planejados, tornam-se aliados. Investir em turismo sustentável significa estimular a visitação responsável, valorizar a cultura local e proteger os ecossistemas que fazem da região um destino único”, afirma.
Ele destaca que práticas sustentáveis não só ajudam o meio ambiente, mas também agregam valor à experiência do turista. “Quando uma pousada investe em energia solar, reaproveitamento de água, redução de plásticos e parcerias com produtores locais, transmite ao turista a sensação de estar contribuindo com algo maior. Essa consciência agrega valor emocional à viagem e atrai novos públicos que priorizam destinos comprometidos com a sustentabilidade”, completa Rodrigo.
Desafios para o futuro
Especialistas destacam que uma atuação integrada é essencial para reduzir riscos e preservar a biodiversidade local. O Plano Estadual de Adaptação e Resiliência Climática (PEARC) reforça a necessidade de colaboração entre diferentes setores para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas na região.
Além disso, iniciativas de turismo sustentável, promovidas em parceria com órgãos como a Setur-SP e o Circuito Litoral Norte, demonstram o potencial da região para se tornar referência em desenvolvimento responsável, conciliando preservação ambiental e valorização da comunidade local.
Essas ações combinadas — públicas e privadas — mostram como a região busca equilibrar desenvolvimento urbano, proteção ambiental e valorização da comunidade local, reforçando a importância de planejamento integrado e práticas responsáveis para enfrentar os impactos climáticos.